Este texto foi publicado em “Os Meninos do Mar”, em maio 2012
A formiga no carreiro
Vinha em sentido diferente…
A vida de cada um de nós tem, afortunadamente na maioria das situações, uma capacidade de evoluir e mudar de rumo que sempre nos surpreende. Quando fui colocada, em 2006/07, logo me avisaram “A colega vai para Miramar mas a escola está para fechar…”. Comecei a lecionar na EB1 de Miramar e senti o delicioso calafrio da mudança, retomei conteúdos e lógicas de que há muito me tinha afastado e procurei, como sempre, fazer algo de marcante. Ainda não sabia que tinha chegado ao sítio certo.
A Escola era antiga mas estava pintada de cores muito vivas e as duas turmas W tinham meninos alegres e comunicativos, quarenta ao todo. A minha colega Helena foi uma preciosa ajuda pelo seu conhecimento do meio, outra pessoa que, em boa hora, chegou nesse ano foi a Gami, mantendo-se também por cinco anos, e os outros professores das AEC. Os Encarregados de Educação estavam muito empenhados e disponíveis para ajudar e tornavam efetivo esse apoio das formas mais necessárias – pagavam horas extra a uma auxiliar para que a escola pudesse funcionar melhor e mais tempo, avós e mães acompanhavam-me nas saídas com a turma, traziam de casa livros, aparelhos domésticos e jogos, disponibilizavam contactos, reuníamos regularmente e estavam abertos às nossas propostas.
Admito que no princípio houve algumas desconfianças em relação a mim, um método de trabalho baseado no reforço da criatividade e autonomia de cada aluno, a teoria das inteligências múltiplas e as fortes convicções a favor da construção e fruição da cultura e da arte… não era bem o que esperavam da professora do 2º/3º anos! Os resultados foram tranquilizadores, os prémios apareceram e os meninos andavam muito bem-dispostos, entusiasmados com o teatro, a música, a dança e as tarefas quotidianas.
A escola foi crescendo de modo inesperado, no ano seguinte já eram setenta alunos, muitos transferidos de colégios e a lotação completa no 1ºano! A falta de espaço começaria a ser um problema sério mas a Associação de Pais estava atenta e tinha diligenciado para tornar possível que a Câmara Municipal fizesse obras profundas de remodelação e ampliação do edifício. Foi preciso reorganizar as turmas, a minha W1 foi alojar-se na Escola de Sá, a W2 manteve-se na escola em obras e a W3 foi acolhida na Escola da Aguda. O transtorno para todos era enorme, por razões várias e dificuldades de natureza diversa, o ano escorria com uma lentidão desesperante! Tenho que fazer um parêntesis de verdadeiro agradecimento aos colegas que partilharam este tempo tão difícil, das escolas que nos aceitaram e partilharam os seus recursos, das Atividades de Enriquecimento Curricular que dividiam as suas tardes pelas três escolas e, claro, às colegas de Escola, Helena e Cláudia, que apesar de tudo se mantinham disponíveis para as festas, projetos e saídas.
O regresso deu-se a dias do final desse ano letivo, forçado por mim, pois queria que os meus alunos que terminavam o 1ºciclo e vinham do “tempo antigo”, vivessem a escola nova, as cores radiosas, o chão liso onde cirandavam em meias, os brinquedos organizados em casinhas e cidades imaginadas que ficavam pelo recreio durante semanas!
A seguir, veio a sala para o 1ºano acompanhada da sua controvérsia que o diálogo resolveu. Pronto, quatro turmas e quatro salas, a escola estava salva!
Durante os cinco anos, (o meu período mais longo de permanência contínua no mesmo estabelecimento de ensino) em que estive na EB1 de Miramar fui confirmando o que há muito intuía, de escola para escola, os professores são igualmente habilitados, generalizadamente dedicados e, “apesar dos pesares”, consomem as suas melhores energias na concretização do sonho de educar e ver crescer os seus alunos; os auxiliares acompanham, limpam, sei lá como conseguem fazer tanto; os encarregados de educação quando têm este gosto, esta generosidade respeitosa, esta claridade de intenções fazem a diferença, constroem a mudança.
( o título é um excerto de uma canção de Zeca Afonso, desculpai a vaidade…)
Foi como emoção que li este teu sentir, estas tuas vivências e caminhadas em prol da formação/ educação daqueles com durante este período contigo se cruzaram.
Agradeço também eu por me ter cruzado contigo, embora em situações diferentes, mas onde deixaste pegadas que ainda hoje perduram.
Abraço
Muito gira esta história da nossa escola e agora é a minha vez de estar no 4º.ano!
O meu comentário é o do prazer de reencontrar-te aqui desde os bancos de escola (LNV) e constatar como passaste tão bem do banco do aluno para o banco de Mestra.
Parabéns!
Prazeres, Estes alunos,e os pais, nunca irão esquecer a sua escola e, sobretudo, COMO aprenderam. Certamente que, quando forem pais, alguns deles verão os seus filhos de modo diferente do comum.
O envolvimento dos pais e de toda a comunidade a que a escola pertence é essencial.
Parabéns a todos e a todas pelo trabalho realizado durante esses anos!